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No futuro, quando as reservas naturais se esgotarem, o bem mais precioso será a água. O cenário de AcQuária é a Terra daqui a centenas de anos, depois de passar pela devastação ambiental provocada pelo homem. O planeta se tornou um grande deserto, e sobreviver tornou-se um desafio. Kim (Junior) é um jovem sonhador que sonha em fazer sucesso com suas músicas, assim como seu pai. Ele mora com Gaspar (Emílio Orciollo Netto), um homem cuja maior preocupação é garantir que a falta d'água não os leve à morte, e o pequeno Guili (Igor Rudolf), um garoto que foi abandonado pelos pais quando bebê e desde então vive com a dupla. Seu fiel escudeiro é Mingus, um cãozinho que o acompanha por toda a parte. Tudo estava em harmonia até a chegada de Sarah (Sandy), uma misteriosa mulher que viu seus pais serem assassinados por um bando de saqueadores quando ainda era uma criança. Encontrada por Kim à beira da morte no deserto, ela passa a morar com eles e um clima tenso surge entre a jovem e Gaspar. A partir daí, a trama gira em torno da convivência entre Sarah, Kim, Gaspar e Guili e a luta pela sobrevivência em condições tão hostis.
Fonte: Sobrecarga
Fotografia e figurino dão gás à ficção científica nacional
Um mundo apocalíptico onde tudo é areia e a água é escassa por causa das ações do homem. Um filme nacional com essa sinopse soa um tanto pretensioso e forçado, levando em conta que uma dupla de cantores são os protagonistas. Mas bastam os primeiros minutos para entender que o dinheiro de um dos maiores investimentos em cinema no Brasil foi bem gasto. Os efeitos visuais são bem feitos (com exceção de um ou outro, como o lagarto de duas cabeças que não deixa rastros na areia) e não saltam aos olhos, destoando do restante.
Tecnicamente, o filme é muito bom. Fotografia e figurino são elementos que merecem menção, nos levando para longe dos palcos e clipes onde Sandy e Junior estavam costumados a atuar. Aliás, a atuação de Sandy é uma boa surpresa, mesmo com alguns deslizes. Infelizmente, o mesmo não pode-se dizer de seu irmão na tela. Kim, personagem de D.L. Junior (como assina nos créditos) soa forçado na maior parte do tempo. Sarah, interpretada por Sandy (agora Leah) e Guili, que ganha vida pelo pequeno Igor Rudolf, seguram a maior parte do longa. Enquanto ela tem maior expressão nas cenas dramáticas, ele é responsável pela comédia, auxiliado por um cachorrinho bem treinado e por sua interação, principalmente, com Gaspar (Emílio Orciollo Neto). Num geral, as atuações são bastante razoáveis e os deslizes não chegam a interferir no andamento.
Num trabalho desse tipo, é preocupante a ideia de que uma boa história possa ser estragada por cenas onde toda a ação pára para que os protagonistas cantem uma música, mas a boa nova é que a música existe sim, mas ela é inserida de modo orgânico à narrativa, o que é um ponto positivo do roteiro. Mas é o roteiro que acaba sendo o empecilho para o desenvolvimento. A introdução se estende por muito tempo, o miolo roda em círculos para que o clímax tenha um desfecho muito corrido. Ainda assim, é corajoso ao criar um mundo totalmente novo, com conceitos, objetos, criaturas e nomes totalmente inventados para que ele seja composto. Além disso, inclui sacadas escondidas para olhos não tão atentos, como uma partitura velha de uma música dos Bales, que com o "e" e o "t" que o tempo rasgou do papel, nos remete a "Blackbird" dos Beatles.
A trilha sonora, além das pequenas e rápidas incursões no repertório de Sandy e Junior e de contar com uma música da banda Shaman para a abertura, é bem coerente durante todo o filme, apesar de que muitos momentos foram deixados mais leves, provavelmente por se tratar de um filme popular para a família, e que ficariam muito mais interessantes com uma trilha mais seca e pesada. Todos esses elementos nos ajudam a crer que a Sarah é uma mulher misteriosa, guerreira e sensual. Só lembramos que ela é a Sandy na cena em que toma banho nua. É uma cena muito bonita, sutil, sem nudez explícita e nem um pouco vulgar, mas ainda assim, é uma cena de banho com a Sandy ali, nua e se insinuando. AcQuária é cheio de momentos desse tipo, sutis e delicados, bem dirigidos por Flávia Moraes, em seu primeiro longa.
Por não parecer brasileiro, o filme é inevitavelmente comparado com os primos de ficção científica norte-americanos, e nessa comparação, a aventura verde e amarela perde, até mesmo em orçamento, alto para o padrão nacional. Mas se levarmos em conta que era um filme que tinha tudo pra dar errrado (cantores protagonistas, Globo Filmes trazendo o risco de uma novela na telona, diretora estreante, efeitos visuais complexos para serem feitos sem precedentes no país), AcQuária se saiu muito bem. Não é um filme para crianças e nem somente para fãs. Bom entretenimento para a família e, porque não, um passo importante para o cinema nacional, já que não temos muitos representantes para o gênero por aqui.